O julgamento do ex-presidente Jair Bolsonaro (PL) no processo criminal por suposta tentativa de golpe de Estado foi marcado para as duas primeiras semanas de setembro, a partir do próximo dia 2.
O Supremo Tribunal Federal (STF) reservou uma sequência de cinco sessões, em 2, 3, 9, 10 e 12 de setembro, na qual será decidido o futuro do ex-presidente e mais sete réus que integraram seu governo. Todos negam as acusações.
Eles fazem parte do chamado “núcleo crucial” da suposta organização criminosa que, segundo a acusação, teria tentado subverter o resultado das eleições de 2022, vencidas pelo atual presidente Luiz Inácio Lula da Silva (PT).
Entre eles, estão três generais do Exército — Augusto Heleno (ex-ministro do Gabinete de Segurança Institucional), Paulo Sérgio Nogueira (ex-ministro da Defesa) e Braga Netto (ex-ministro da Casa Civil) — e Almir Garnier Santos, ex-comandante da Marinha.
Também são réus Alexandre Ramagem, ex-diretor-geral da Agência Brasileira de Inteligência (Abin); Anderson Torres, ex-ministro da Justiça; Mauro Cid, e ex-ajudante de ordens de Bolsonaro e que fez uma delação premiada que embasa parte da acusação.
O julgamento ocorrerá na Primeira Turma da Corte, formada por cinco ministros: Alexandre de Moraes (relator do caso), Flávio Dino, Luiz Fux, Carmen Lúcia e Cristiano Zanin (presidente da Turma).
Bolsonaro aguarda a decisão do STF em prisão domiciliar, decretada no início de agosto por Moraes, após o ministro considerar que o réu descumpriu a medida cautelar de não se expressar por meio de redes sociais.
Essa proibição havia sido determinada em 18 de julho, quando o ex-presidente também passou a ser monitorado por tornozeleira eletrônica.
A justificativa para as medidas foi a atuação de Bolsonaro e seu filho, o deputado federal Eduardo Bolsonaro (PL-SP), junto ao governo de Donald Trump, presidente dos Estados Unidos, buscando retaliações contra os ministros do STF para interferir no andamento do processo.
Desde julho, a gestão Trump adotou medidas diretas contra o Brasil, citando uma suposta perseguição a Bolsonaro como justificativa. Entre as ações está uma tarifa de 50% sobre boa parte dos produtos brasileiros vendidos aos EUA, a suspensão de vistos de ministros do STF e a inclusão de Moraes em restrições financeiras previstas na Lei Magnitsky.
No processo que será julgado em setembro, o procurador-geral da República, Paulo Gonet, pediu a condenação de Bolsonaro pelas acusações de liderar organização criminosa armada; tentativa de abolição violenta do Estado Democrático de Direito; golpe de Estado; dano contra patrimônio da União; e deterioração de patrimônio tombado.
A defesa de Bolsonaro afirmou em suas alegações finais ao STF que a acusação de Gonet é “absurda” e que não há provas que liguem o ex-presidente aos planos para matar autoridades “e muitos menos aos atos de 8 de janeiro”, quando apoiadores do presidente invadiram as sedes dos Três Poderes em Brasília.
“Em momento algum Jair Bolsonaro praticou qualquer conduta que tivesse por finalidade impedir ou dificultar a posse do então presidente eleito Luiz Inácio Lula da Silva. Pelo contrário, sempre defendeu e reafirmou a democracia e o Estado de Direito”, disse a defesa de Bolsonaro.
Na peça de 197 páginas, a defesa afirma ainda que a delação de Mauro Cid, ex-ajudante de ordens de Bolsonaro, deve ser anulada, classificando-o como um “delator sem credibilidade”.
Se condenado por todos esses crimes, a pena contra o ex-presidente pode superar 40 anos.
O julgamento foi marcado após o processo cumprir etapas obrigatórias, como depoimentos de testemunhas e interrogatórios dos réus.
Mesmo preso preventivamente, o ex-presidente pode comparecer normalmente ao julgamento no STF, segundo explica Álvaro Jorge, professor da FGV Direito Rio.
O tempo de prisão preventiva é deduzido de eventual pena de prisão determinada na sentença, acrescenta.
De acordo com a acusação da PGR, a tentativa de golpe articulada pelo núcleo crucial teria começado com a campanha contra o sistema eletrônico de votação durante o governo Bolsonaro (2019-2022); seguido com a pressão sobre as Forças Armadas para aderir ao plano e culminado nos ataques às sedes dos Três Poderes em Brasília em 8 janeiro de 2023.
Bolsonaro reconhece que realizou reuniões com os comandantes das Forças Armadas, mas afirma que não cometeu ilegalidades porque discutiu apenas alternativas que estariam dentro da Constituição, sem levar qualquer ação adiante.
Se condenado, ele provavelmente seguirá cumprindo pena em prisão domiciliar, devido a problemas de saúde, seguindo o precedente recente da prisão do ex-presidente Fernando Collor.
Caminho atribulado até o julgamento
Antes do julgamento, em 18 de julho, Bolsonaro foi submetido a outras medidas cautelares impostas por Moraes, como parte do processo por tentativa de golpe.
Bolsonaro passou a usar tornozeleira eletrônica, foi impedido de usar redes sociais e proibido de sair de casa entre 19h e 6h de segunda a sexta-feira, além dos fins de semana e feriados integralmente.
Ele também foi impedido de manter contato com embaixadores, autoridades estrangeiras e de se aproximar de sedes de embaixadas e consulados.
A Polícia Federal (PF), que solicitou as medidas cautelares, argumentou que Bolsonaro e um de seus filhos, o deputado federal Eduardo Bolsonaro (PL-SP), estariam atuando junto a autoridades americanas para obter sanções contra autoridades brasileiras.
Além disso, segundo a PF, haveria indícios de que ambos poderiam estar praticando coação no curso do processo, obstrução de investigação e abolição violenta do Estado Democrático de Direito.
Eduardo Bolsonaro se licenciou do cargo de deputado federal e se mudou para os EUA, onde vem pressionando o governo americano a tomar medidas contra Moraes e o STF, além de buscar apoio à anistia dos envolvidos nos atos de 8 de janeiro, em Brasília.
*Com informações de Mariana Schreiber, da BBC News Brasil em Brasília, e Julia Braun, da BBC News Brasil em Londres
Por Gazeta do DF
Fonte Correio Braziliense
Foto: EPA