Biblioteca social inspira crianças e adultos em vulnerabilidade na Ceilândia

Esses espaços exercem um impacto direto e positivo na vida de inúmeras pessoas, o que assegura o acesso à leitura para crianças, jovens e adultos

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Nove degraus separam um pedaço lúdico e literário de Alice no País das Maravilhas para a mente literária das crianças da Ceilândia. Com um passo adiante, já adentramos num mundo de magia e encanto bem parecido com o país das maravilhas de Alice e até mesmo como o mundo de Nárnia, livre de problemas e caos.

Nos corações dos leitores, as bibliotecas comunitárias assumem a aura de mundos mágicos e também são iniciativas importantes lideradas por moradores ou entidades não governamentais que desempenham um papel crucial na promoção da cultura e da leitura em prol das comunidades.

Esses espaços exercem um impacto direto e positivo na vida de inúmeras pessoas, o que assegura o acesso à leitura para crianças, jovens e adultos.

Roedores de Livros

A expressão “rato de biblioteca”, utilizada para descrever alguém que passa a maior parte de seu tempo escondido entre as prateleiras das bibliotecas, dedicando-se intensamente à leitura. A partir dessa ideia, o projeto “Roedores de Livros” tomou forma e se concretizou.

A biblioteca comunitária Roedores de Livros surgiu em 2006, fruto da paixão da professora Ana Paula Bernardes pela leitura com o desejo de contribuir para o bem-estar social e cultural de outras pessoas.

A junção de tudo isso conseguiu materializar o sonho com a vida real.

O objetivo inicial do projeto é estimular o incentivo à leitura desde a infância e mais do que isso, fazer com que as oportunidades sejam equivalentes para todos.

A biblioteca marcou um legado de vidas no pequeno espaço no 2º andar do Shopping Popular, localizado em Ceilândia, uma das regiões administrativas mais populosas do Distrito Federal.

Base

Essa foi a expressão escolhida por Rahides Farias Lima, de 19, é uma ex-roedora e participante assídua do projeto Roedores de Livros, para descrever a experiência que teve.

O amor pelos livros infantis floresceu aos seis anos de idade, e desde então, seus sábados se transformaram em capítulos enriquecedores em sua jornada de desenvolvimento pessoal.

A descoberta do projeto ocorreu por meio de sua mãe, uma feirante no Shopping Popular, que facilitou o incentivo para conhecer mais sobre os roedores.

Atualmente, Rahides é estudante de engenharia química na UnB e diz que por meio dos roedores, conseguiu desenvolver o hábito da leitura, algo que antes não era tão frequente, mas que agora se tornou uma paixão.

Era uma vez?

O Roedores de Livros é uma história que não se restringe a prateleiras, indo além da fantasia dos contos infantis e dos sonhos mais lúdicos.

É uma realidade que se cumpre na vida real e cotidiana daqueles que têm a coragem de entrar no mundo de descobertas e transformações. Tudo isso impulsionado pela solidariedade que é o pilar que sustenta essas vivências reais.

Protagonista

Essa história poderia iniciar com o famoso “Era uma vez…”, mas diferente dos contos, a protagonista não é apenas a princesa mas também o príncipe e a fada madrinha, que no final se salva pelo encanto dos livros.

A professora da rede pública Ana Paula Bernardes, de 54 anos, idealizadora do projeto e graduada em artes plásticas pela Universidade de Brasília (UnB), teve uma infância difícil onde ainda pequena precisou enfrentar o primeiro dragão com a perda dos pais e para enfrentar a solidão e com poucos recursos na época, foi através da literatura que descobriu um refúgio nos livros.

Como uma boa amante da literatura, acabou se aproximando da vertente infantil. Já na idade adulta, se transformou na fada madrinha de outras crianças, mostrando para elas que dá para viajar no tapete mágico e viver em outros mundos, com novas aventuras e viver sonhos impossíveis.

O que era apenas uma válvula de escape da dura realidade, se tornou um farol de inspiração capaz de moldar o destino de inúmeras crianças e deixar um impacto duradouro em suas vidas.

Mal sabia que apenas com uma ideia, mudaria a vida de Rahides, Maria Victória, Vitória e de mais outras mil crianças que passaram pelo seu caminho.

“Eu consegui fazer esse trabalho voluntário porque eu venho de uma infância muito difícil e que eu lia muito porque eu estava muito só. Nessa de ficar sozinha, comecei a ler e ler e eu achava o maior barato e queria fazer alguma coisa para as crianças. Sempre quis fazer alguma coisa para as crianças assim” cita Ana.

Lutas e desafios

A professora Ana Paula Bernardes relatou que a biblioteca encontrou dificuldades ao retomar suas atividades durante o pós-pandemia.

Existiram diversos desafios, e o maior deles ainda é prender a atenção das crianças na mediação de leitura que acontece todos os sábados. A mediação estimula a interação das crianças com a história

Ana teve que se reinventar, trazendo oficinas e brincadeiras para cativar as crianças e trazer de volta a infância longe das telas. Além disso, apostou em lanchinhos pós leitura para animar as crianças em ficar nas mediações.

O retorno pós pandemia ainda deixa marcas mas com o tempo as crianças voltaram a alegrar a sala do segundo andar do shopping popular da Ceilândia.

Entre brincadeiras, lanches e oficinas a leitura invade a sala e a imaginação de todos que participam dos roedores.

Tapete Vermelho

Para manter o projeto vivo, Ana Paula Bernardes e Tino Freitas começaram a compartilhar suas histórias, dando origem ao projeto.

Eles começaram a contar histórias em um gramado, porém surgiu um problema: formigas e insetos que incomodavam as crianças. Foi então que o tapete vermelho entrou em cena, oferecendo abrigo e conforto aos jovens leitores.

Os Roedores de Livros valorizam as maiores riquezas do mundo: as crianças. Sentadas nas almofadas sobre o vibrante tapete vermelho, elas mergulham em diversas histórias da literatura infantojuvenil. Esse tapete representa o poder simbólico, já que antigamente apenas os mais ricos possuíam túnicas e tapetes vermelhos.

A biblioteca dos Roedores possui um acervo de cinco mil obras, mas recebe doações com gratidão. Devido à quantidade de livros disponíveis, as doações são encaminhadas para os outros polos culturais da região.

Por Jornal de Brasília

Foto: Divulgação / Reprodução Jornal de Brasília