“Muitas vezes, só consigo dormir às 5h, para acordar às 6h30. É muito difícil e cansativo viver assim, porque, no outro dia, fico muito irritada e sem conseguir render nas minhas atividades”, conta a professora aposentada Cristiane Rolim, 52, que convive com a insônia há pelo menos 18 anos. O mesmo drama faz parte de uma realidade que atinge milhões. Segundo a Academia Brasileira do Sono, 45% dos brasileiros relatam algum problema de sono, e 72% apresentam doenças relacionadas ao momento de dormir.
Caracterizada pela dificuldade em iniciar ou manter o adormecimento, despertares frequentes ou pela sensação de sono não reparador, a insônia pode afetar indivíduos de todas as idades, embora seja mais prevalente em adultos e idosos.
Com Cristiane, o problema teve início com o aumento da jornada de trabalho. “Chegava em casa quase meia-noite, depois de dirigir 30 quilômetros e ainda trabalhava de manhã. Não conseguia dormir, acordava cansada, como se estivesse de ressaca”, lembra.
Para ela, a condição afetou não apenas o corpo, mas também o humor e a disposição. “Fico fatigada o dia todo, sem energia para qualquer atividade. Em épocas de crise, minha concentração é zero”, afirma. Hoje, acompanhada por um psiquiatra, a professora aposentada toma uma combinação de medicamentos que ajudam a iniciar e manter o sono.
Tipos
De acordo com o neurologista e médico do sono Lúcio Huebra, existem dois tipos principais de distúrbio: a de curto prazo, geralmente desencadeada por eventos estressantes pontuais; e a crônica, que persiste independentemente de aspectos externos e é frequentemente alimentada por ansiedade, hábitos inadequados e crenças disfuncionais sobre o sono. “A insônia pode surgir da combinação de predisposição genética e de fatores estressores, como luto ou grandes mudanças. A de curto prazo tende a melhorar com a resolução do problema que a desencadeou, já a crônica se perpetua mesmo sem esses gatilhos”, explica Huebra.
O médico alerta que os efeitos vão muito além do cansaço. “A insônia traz maior irritabilidade e reatividade, reduzindo o limiar de frustração, podendo, inclusive, levar a reações desproporcionais ou até mesmo agressivas. A longo prazo, a persistência de má qualidade de sono aumenta o ganho de peso, traz repercussões metabólicas, como diabetes, alterações do colesterol, hipertensão arterial, além de aumentar o risco cardiovascular”, alerta.
Desgaste constante
Para Erika Mendes, 20, a condição vem acompanhada de um desgaste constante que atravessa corpo e mente. “Quando não consigo dormir, sinto uma ansiedade fora do normal, um fluxo de pensamentos que não acaba. Penso em tudo na minha vida, reflito sobre todos os dias, tenho memórias que vêm e vão, e isso me deixa muito exausta”, diz.
A estudante explica que a dificuldade para dormir influencia áreas da vida pessoal. “Prejudica minha saúde física, inclusive, minha imunidade, porque estou quase sempre cansada e doente. Afeta meu humor, minha concentração e até minha disposição para interagir com outras pessoas”, relata.
Apesar de buscar soluções, Erika destaca que poucos métodos trouxeram alívio real. “Tentei meditação, técnicas de respiração, ajustar travesseiros, tomar melatonina, contar carneirinhos, escrever e criar histórias. Nada funcionou completamente. Hoje, o que mais me ajuda é fazer alguma atividade que me deixe realmente cansada, seja exercício, escrita ou leitura”, detalha.
O psiquiatra Alexandre Pinto de Azevedo, do Programa de Transtornos do Sono do Hospital das Clínicas da USP e membro da Academia Brasileira do Sono, explica que não existe uma regra única para todas as pessoas. “As recomendações devem ser particularizadas de acordo com fatores como disponibilidade de tempo, cronotipo, uso de medicamentos e idade”, ressalta.
De forma geral, ele aconselha a evitar eletrônicos antes de dormir, porque a luz emitida por telas bloqueia a liberação da melatonina e atrasa a sinalização do sono. Também é importante manter horários fixos para dormir e acordar, evitar álcool, cafeína, energéticos e refeições pesadas à noite.
Para o especialista, um dos maiores desafios no tratamento da insônia crônica está justamente nos hábitos dos pacientes. “O principal fator mantenedor são os comportamentos disfuncionais em relação ao ato de dormir, que muitas vezes comprometem a eficácia do tratamento, seja ele não farmacológico ou baseado em medicamentos”, assinala Azevedo.
Criar rituais individuais para desacelerar a mente é outro ponto fundamental no combate ao distúrbio. “Uma rotina de desaceleração, como tomar um banho morno, ler algo leve ou ouvir música tranquila, ajuda na preparação para dormir”, afirma Azevedo. Ele recomenda ainda reduzir estímulos digitais ao menos uma hora antes de deitar-se e, quando necessário, adotar técnicas de relaxamento mental, como respiração controlada e relaxamento muscular progressivo. Outra estratégia indicada pelo psiquiatra é o chamado “diário da mente”: escrever tarefas e preocupações antes de dormir, para esvaziar a mente e reduzir o ciclo de pensamentos repetitivos.
Recomendações
- Evitar estímulos digitais pelo menos uma hora antes de dormir;
- Manter horários fixos para dormir e acordar;
- Evitar álcool, cafeína, energéticos e refeições pesadas à noite;
- Criar uma rotina de desaceleração, como tomar um banho morno, ler algo leve ou ouvir música tranquila também ajuda na preparação para dormir;
- Quando necessário, usar técnicas para relaxar a mente, como controle da respiração e relaxamento muscular progressivo;
- Manter um diário da mente, técnica que consiste em escrever tarefas e preocupações antes de dormir.
Obs.: As recomendações devem ser adequadas caso a caso.
Fonte: Alexandre Pinto de Azevedo, psiquiatra
Por Gazeta do DF
Fonte Correio Braziliense
Foto: Maurenilson Freire