Energia que cura: a busca pela saúde por meio de saberes espirituais

Baseados em conceitos milenares, Reike, passes e benzimentos ganham adeptos em busca de terapias alternativas para a cura do corpo e do espírito

A busca pela cura acompanha a humanidade desde os seus primórdios. Civilizações ao longo da história desenvolveram práticas e rituais voltados ao restabelecimento da saúde, ancorados em saberes espirituais. Entre essas práticas, o uso das mãos como instrumento de cura ocupa lugar de destaque.

Em rituais religiosos, as mãos eram vistas como canais de energia ou manifestações do divino. Da mesma forma, terapias alternativas contemporâneas, como o Reiki, resgatam e reinterpretam essa antiga crença como veículos de equilíbrio e restauração energética.

Segundo Renato Menezes, mestre de Reiki nível 4 pelo sistema tradicional Usui, a técnica tem como objetivo harmonizar a energia vital universal (Rei) com a energia vital individual (Ki), promovendo o equilíbrio físico, mental, emocional e espiritual. Originado no Japão e redescoberto por Mikao Usui em 1922, durante um retiro espiritual no Monte Kurama, em Kyoto, o Reiki é praticado por mestres que utilizam símbolos sagrados para sintonizar a glândula pineal e desbloquear os canais energéticos do corpo.

“A energia entra pelo topo da cabeça, no chakra coronário, percorre o sistema energético até o chakra cardíaco e é transmitida pelas palmas das mãos, onde estão localizados chakras específicos”, explica Renato. Dessa forma, o Reiki atua como um canal de reconexão entre o indivíduo e a energia universal, facilitando processos de cura e autoconhecimento.

Para ele, o Reiki vai além do alívio de sintomas. “Os milagres do Reiki vão na causa da doença e não na consequência. A teoria é que a doença física pode ter começado como um bloqueio energético, e depois se manifesta no corpo físico. Às vezes, algo emocional, mental ou espiritual gera esse bloqueio energético que, se não tratado, se transforma em algo físico”, completa Renato. 

Os benefícios mais relatados da prática incluem alívio do estresse e da ansiedade, sensação de leveza, melhora na qualidade do sono, além de aumento da clareza mental e da capacidade de foco. A Organização Mundial da Saúde (OMS) e o Sistema Único de Saúde (SUS) reconhecem o Reiki como uma terapia holística que pode ser utilizada de forma complementar no tratamento de doenças, principalmente nos casos de enfermidades psicossomáticas derivadas do estresse.

A analista de sistemas Ana Lúcia, 38, moradora de Samambaia Norte, conectou-se ao Reiki buscando autoconhecimento e cura emocional. A técnica apareceu como resposta após tentar outras abordagens. “Eu estava procurando várias terapias alternativas e achei o Reiki. O efeito placebo é a maior comprovação das ciências que não são palpáveis”, avalia.

Para ela, o Reiki foi essencial para enfrentar bloqueios internos. “Eu tinha muita dificuldade de perdoar. Com outros tipos de terapias eu não consegui, mas com o Reiki, eu resolvi isso”, conta. Além dos benefícios emocionais, ela também percebeu alívio físico. “Tive melhoras de dores, por exemplo, de cólica.”

Passe espírita

Na religião espírita, o passe também é compreendido como uma transfusão de energias. Paulo Maia, presidente da Federação Espírita do Distrito Federal explica que a prática é um recurso de assistência espiritual, no qual o passista doa fluidos magnéticos (humanos) e espirituais (oriundos dos benfeitores), com o objetivo de auxiliar no reequilíbrio do corpo espiritual e, por consequência, do corpo físico.

De acordo com ele, o passe pode proporcionar calma, alívio de dores físicas, serenidade emocional, equilíbrio psíquico e espiritual. Atua nos centros de força (ou chakras), ajudando a harmonizar o perispírito, que, por sua vez, influencia o corpo físico. “De modo geral, os relatos mais frequentes indicam sensações de paz, leveza, alívio de tensões, melhora de dores físicas, além de conforto emocional. Muitos dizem sentir-se renovados após o passe, como se tivessem sido abraçados por uma presença suave e amorosa”, destaca Paulo.

Além dos passes, o espiritismo também pratica a cirurgia espiritual, que se baseia na ação dos fluidos dos espíritos e dos médiuns. Essas cirurgias ocorrem principalmente em atendimentos fraternos e tratamentos espirituais, e têm como base os ensinamentos sobre passes, magnetismo e a influência dos espíritos sobre o corpo físico. São realizadas por espíritos benevolentes, com a ajuda de médiuns, atuando no campo energético (perispírito) do paciente. O objetivo é restaurar desequilíbrios energéticos que, conforme os adeptos, muitas vezes estão ligados a experiências de vidas passadas ou a atitudes da vida atual.

Benzimento

Mais do que um alívio para dores físicas, o benzimento tem sido procurado por quem busca equilíbrio emocional, acolhimento, espiritualidade e boas energias. Na Escola de Almas Benzedeiras de Brasília, as sessões reúnem pessoas de diferentes regiões do DF em busca de cura do corpo e da alma.

A médica aposentada, terapeuta holística e benzedeira Marcia Maurity, 73, moradora do Cruzeiro Novo, participa ativamente dos atendimentos e faz questão de ajudar quem precisa. Os encontros ocorrem em seis locais: Parque Ecológico Sucupira de Planaltina, Parque Ecológico da Asa Sul, Parque Ecológico do Riacho Fundo I, Unidade Básica de Saúde (UBS) 6 de Taguatinga, UBS 9 de São Sebastião e UBS 1 do Lago Norte. Para ela, a fé também tem lugar na saúde.

“Vai da fé de cada pessoa. Na minha vida, ela é primordial. Como eu sou médica e benzedeira, eu cuidei da minha mãe durante 10 anos e ela nunca precisou de internação. Ela foi cuidada em casa por homeopata, acupunturista, massoterapeuta e neurologista. O neurologista não aceitava o tratamento da homeopatia, mas eu acreditava”, observa. 

A professora aposentada Tânia Vilela, 58, saiu da Ponte Alta, no Gama, até São Sebastião, para receber o benzimento. Ela aproveitou a oportunidade para entender como pode se tornar uma benzedeira. “Eu já faço o benzimento em casa, no meu marido, nas minhas filhas, nos meus cachorros e nas minhas plantas. Eu vejo resultado. Benzer é abençoar. Diminuiu muito a ansiedade da minha filha começar a benzer ela”, diz.

Ciência e fé lado a lado

Flávia Squinca, integrante do Observatório de Práticas Integrativas da Universidade de Brasília (UnB) e mestre e doutora em Ciências da Saúde, explica que as práticas integrativas não se sobrepõem nem concorrem com os tratamentos do modelo biomédico. Pelo contrário: elas se complementam às condutas médicas e dos demais profissionais da saúde.

Sobre as evidências científicas, Flávia afirma que existem. Segundo ela, é possível encontrar, em bases de dados reconhecidas, estudos que avaliam os efeitos das práticas integrativas. Essas pesquisas envolvem grupos de pessoas que receberam intervenções como Reiki, uso de florais, acupuntura, meditação ou que participaram de grupos terapêuticos com essas abordagens. Ela ressalta, no entanto, que esses estudos seguem metodologias diferentes daquelas utilizadas em pesquisas com vacinas ou medicamentos, exigindo outros paradigmas de análise.

“As práticas integrativas chegam ao cuidado em saúde como uma tecnologia leve, e com uma perspectiva ampliada do ser humano, que envolve dimensões biológicas, psíquicas, sociais e espirituais (sem que isso signifique religião, necessariamente)”, declara.

Ao Correio, a Secretaria de Saúde (SES-DF) informou que não adota e nem possui políticas públicas voltadas à chamada “cura por meio da fé”. A rede pública de saúde do Distrito Federal não pratica nem oferece esse tipo de abordagem terapêutica. No entanto, o órgão salienta que o Sistema Único de Saúde (SUS), por meio da Política Nacional de Práticas Integrativas e Complementares em Saúde (PNPICS), oferta algumas terapias complementares, com base em critérios técnicos e científicos.

No âmbito do DF, algumas unidades de saúde oferecem práticas como acupuntura, homeopatia, auriculoterapia, fitoterapia, entre outras, conforme a disponibilidade de profissionais capacitados e da estrutura local. Todas seguem diretrizes do Ministério da Saúde e estão integradas à atenção básica, com foco na promoção da saúde, prevenção de doenças e cuidado integral ao paciente.

*Estagiária sob a supervisão de Malcia Afonso

Por Gazeta do DF

Fonte Correio Braziliense       

Foto: Bruna Gaston CB/DA Press