Quando a admiração motiva a pessoa a mudar o curso da vida

Na segunda reportagem da série Amor além do cuidado, uma experiência vivida no setor de hemodinâmica do Hospital de Base mudou a vida de Yeda Cristina Maciel

Yeda Cristina Maciel, 61 anos, carrega no peito uma mistura de gratidão, orgulho e propósito. Técnica de enfermagem na hemodinâmica do Hospital de Base, ela caminha hoje pelos mesmos corredores onde, anos atrás, viveu um dos momentos mais delicados de sua vida: acompanhar a mãe em um processo de emergência cardíaca. 

A experiência, que poderia ter ficado marcada apenas pela dor, tornou-se um divisor de águas. Diante da dedicação da equipe médica, nasceu o desejo de se tornar parte daquele time. Esta é a segunda reportagem da série Amor além do cuidado, que conta histórias de laços — de amor, amizade e compaixão — atados nos hospitais do Distrital Federal.  

Natural do Rio de Janeiro, Yeda se mudou para Brasília em 1994 e construiu sua trajetória profissional longe da saúde, atuando como secretária e coordenadora na Universidade de Brasília (UnB). Mas a vocação parecia chamá-la de longe. 

Aos 50 anos, decidiu mudar de rumo e ingressou na enfermagem, profissão que define como sua grande realização. “Sempre sonhei em trabalhar na área da saúde. Para mim, o Hospital de Base era como uma caixinha mágica. Eu dizia: ‘Um dia ainda vou trabalhar aqui.'”

O destino tratou de aproximá-la ainda mais daquele universo. Em uma manhã de emergência, Yeda recebeu a notícia de que sua mãe havia sido levada às pressas ao Hospital de Base, com a frequência cardíaca baixa. Foram dias de angústia e vigília, observando os sinais vitais despencarem. 

Um gesto, porém, a acalentou. O médico Joaquim Vieira Júnior, ao passar pelo leito, determinou que a cirurgia para implantação de um marcapasso fosse feita imediatamente. O procedimento devolveu qualidade de vida à sua mãe e deixou em Yeda uma marca profunda. 

“Mamãe esmorecia sempre que precisava voltar ao hospital. Mas eu a avisava: o atendimento é com aquele médico que a senhora gosta’. Então, ela se alegrava mais. Gostava muito dele, porque era sempre brincalhão. Isso amenizava a tensão daquele momento”, destaca. 

O carinho e a dedicação da equipe a fizeram se apaixonar ainda mais pela enfermagem. “Foi Deus que colocou aqueles profissionais no caminho da minha mãe”, recorda.

Aprovação

Após seis anos em um hospital particular da Asa Norte, Yeda chegou a pensar em se aposentar. Mas o chamado do sonho falou mais alto quando surgiram vagas no processo seletivo do Hospital de Base. Inscreveu-se, foi aprovada em primeiro lugar na entrevista e, em dezembro de 2024, passou a integrar a equipe da hemodinâmica.

“Conseguir isso aos 60 anos foi uma honra imensa. A idade pesa, sim, mas não apaga nossos sonhos nem nossa força”, afirma. A hemodinâmica é um ramo da medicina que estuda a mecânica do fluxo sanguíneo e utiliza técnicas minimamente invasivas para diagnosticar e tratar doenças cardiovasculares, neurológicas e vasculares, como obstruções, aneurismas e arritmias.

Hoje, Yeda trabalha lado a lado com o mesmo médico que salvou a vida de sua mãe, experiência que define como um presente. Mesmo após a perda da mãe, há pouco mais de um ano, ela carrega o consolo de saber que o cuidado recebido prolongou sua presença. 

“Sempre que vejo uma vida sendo salva, lembro que um dia minha mãe também foi. É um orgulho imenso poder estar aqui, no lugar onde tudo começou”, diz.

Alegrias da carreira

Para o médico Joaquim, 61, cirurgião cardíaco na área de cardioestimulação, saber que a atuação de seu time inspirou Yeda a seguir pelo mesmo caminho é motivo de surpresa e orgulho. “Alegrias da carreira. Ela conquistou esse sonho e, hoje, nos encontramos nos corredores, compartilhando boas lembranças e histórias”, declara.

Acompanhar a evolução dos pacientes e, sobretudo, ver os residentes se tornarem profissionais — “ainda melhores que nós”, pontua — é motivo de esperança. Já a atenção e o cuidado com quem atende deve, segundo ele, acompanhar os procedimentos técnicos. É tão importante quanto. E esse aprendizado é fruto de um conselho da mãe. 

“Ela dizia: ‘Atenda seus pacientes como gostaria que os seus pais fossem tratados’. Isso moldou minha prática médica, porque, ainda que eu seja exigente, procuro sempre olhar, ouvir e me colocar no lugar de cada pessoa que passa por mim no hospital. Acredito que quem nasce para a medicina jamais se afasta dela”, conta.

Todas as terças-feiras, Yeda e Joaquim caminham juntos pelo setor da hemodinâmica, onde ela acolhe pacientes que chegam em estado semelhante ao da mãe, além de auxiliar os médicos em novos procedimentos. Para Yeda, cada atendimento é uma forma de devolver o carinho que recebeu.

Por Revista Plano B

Fonte Correio Braziliense

Foto: Marcelo Ferreira/CB/D.A Press