Tudo que o consumidor espera quando chega a uma hospedagem é não ter problemas com a reserva feita previamente, não decepcionar-se com o lugar anunciado e poder descansar em um espaço aconchegante. Mas, a expectativa de conforto pode ser frustrada quando os serviços contratados estão em desacordo com o que foi oferecido.
Giovanna Lima conta que em viagem a um congresso no Rio de Janeiro hospedou-se na Barra da Tijuca. Assim que chegou ao quarto e ficou descalça percebeu que o chão estava sujo com poeira, mas como estava cansada, decidiu descansar antes de pedir uma limpeza no local. “Quando me deitei na cama de casal, encontrei uma mancha de sangue no lençol, fiquei com receio de pegar alguma doença!”, relembra.
Ela diz que pensou que os problemas tinham acabado, porém, na hora de dormir, percebeu que o ar-condicionado não funcionava. “Ventilava apenas, não esfriava, e fazia um barulho muito alto. Passei uma noite péssima, por causa do barulho e do calor, e eu tive que acordar bem cedo para ir a um congresso”, recorda-se.
Responsabilidade
Karoline Fleury Morais, advogada, pós-graduada em direito civil e processo civil e pós-graduanda em direito empresarial, comenta que, de acordo com o art. 20 do Código de Defesa do Consumidor (CDC), se o serviço de hospedagem apresentar falhas na qualidade, o consumidor tem o direito de exigir a reexecução do serviço sem custo adicional, o abatimento proporcional do preço ou a restituição integral do valor pago, devidamente corrigido a depender de cada caso. “Além disso, o art. 14 do CDC determina que o prestador do serviço responde de forma objetiva pelos danos causados ao consumidor devido à má prestação do serviço, incluindo tanto os danos materiais quanto os morais, independentemente de culpa”, completa.
Nos casos em que a reserva é cancelada pela prestadora ou anfitrião próximo à data do check-in, a advogada Jéssica Marques explica que, se a reserva estiver paga, deve haver o reembolso de todos os valores pagos antecipadamente ou realocação do consumidor imediatamente para outra acomodação de iguais ou melhores condições. “Além disso, a depender da situação, o consumidor poderá requerer o ressarcimento dos eventuais prejuízos ocasionados pelo cancelamento inesperado”, afirma.
“Quando o anúncio da estadia não condiz com a realidade, o art. 37 do CDC proíbe expressamente a prática de propaganda enganosa, ou seja, quando as informações divulgadas induzem o consumidor ao erro, seja por omissão, seja pela apresentação de dados falsos ou distorcidos sobre um produto ou serviço. Se for comprovada a ocorrência de propaganda enganosa, o consumidor tem direito de exigir a rescisão do contrato, com o reembolso dos valores pagos, e pode também pleitear indenização pelos prejuízos sofridos”, detalha Karoline.
A advogada destaca que, quando o consumidor contrata o serviço de estadia em plataformas de reservas e o acordo é descumprido de alguma forma, a orientação inicial é comunicar o problema à plataforma e ao anfitrião, anexando provas do descumprimento. Se a questão não for resolvida, é possível formalizar reclamação em órgãos como o Procon ou acionar judicialmente os responsáveis. “O art. 30 do CDC assegura que toda informação ou publicidade vinculada obriga o fornecedor a cumpri-la, garantindo ao consumidor a execução fiel do serviço anunciado”, diz.
Plataformas
Uma leitora da coluna, que preferiu não se identificar, conta que fez uma reserva em uma plataforma de estadia para três pessoas. “Fui a primeira a chegar e ia dormir a primeira noite sozinha. O apartamento estava com muito cheiro de gás, então, mandei mensagem para o proprietário, que falou que era normal e orientou-me a deixar a janela aberta. A noite esfriou e precisei fechar a janela e o cheiro piorou, comecei a ficar com náuseas. Liguei imediatamente para a central da própria plataforma de hospedagem, que me atendeu em inglês, informei o ocorrido e eles, de prontidão, abriram um processo e disponibilizaram um voucher para que eu me mudasse para um hotel na manhã seguinte. Fiz isso, foi ótimo, mas acho que o proprietário recebeu algum tipo de notificação e começou a me mandar mensagens com ameaças, perguntando por que não liguei para ele. Parei de respondê-lo,” relata.
Karoline observa que plataformas de reservas podem ser responsabilizadas solidariamente “nos termos do art. 7º, § único, do CDC, quando atuam como intermediárias diretas, especialmente se houver omissão na resolução de disputas. A transparência e a boa-fé exigidas pelo art. 4º do CDC impõem às plataformas a adoção de mecanismos efetivos para mediar e resolver conflitos”, completa.
Privacidade
Outro problema que pode ocorrer é a instalação de câmeras de vigilância sem o consentimento do hóspede. Esse ato configura violação à privacidade, sendo uma conduta passível de responsabilização penal. “Caso o anfitrião consiga efetuar a gravação, estará configurada a infração consumada prevista no art. 216-B do Código Penal.
“Diante dessa situação, o consumidor deve registrar um boletim de ocorrência, reunir todas as provas possíveis, como fotos, vídeos, mensagens ou qualquer evidência que confirme a presença e o uso indevido do dispositivo de vigilância, e buscar reparação judicial, tanto na esfera penal quanto na cível, para assegurar seus direitos e obter eventuais indenizações”, salienta a advogada Jéssica.
*Estagiário sob a supervisão de Márcia Machado
Por José Albuquerque do Correio Braziliense
Foto: Caio Gomez / Reprodução Correio Braziliense