OAB-DF lança campanha contra fogos de artifício com barulho

Rojões prejudicam principalmente pessoas com Transtorno do Espectro Autista (TEA) e animais

As festas de fim de ano, em especial a do Natal e Ano Novo, costumam ser acompanhadas de grandes fogos de artifício com barulho, o que é proibido por lei. Em busca de conscientizar a população do Distrito Federal sobre os impactos negativos do som para as pessoas com Transtorno do Espectro Autista (TEA) e animais, a Seccional do DF da Ordem dos Advogados do Brasil (OAB/DF) lançou a 4ª edição da campanha “Diga não aos rojões e fogos de artifício com barulho”.

Pessoas com TEA e animais costumam ser mais sensíveis a barulhos, e em razão de estrondos intensos, podem entrar em pânico e se machucar. No caso dos pets, o mesmo pode até perder a vida por conta dos fogos de artifícios. Para a presidente da Comissão de Defesa dos Direitos da Pessoa com Autismo da OAB/DF, Flávia Amaral, é essencial que a população tenha consciência dos danos causados pelos rojões.

“É essencial promover a sensibilização da sociedade para o não uso de rojões e fogos de artifício com barulho, além de ampliar o conhecimento sobre a hipersensibilidade auditiva dos autistas. As celebrações podem acontecer de outras formas, porque, mesmo com os esforços de proteção das famílias, crises podem ser desencadeadas. Isso não só afeta diretamente os autistas, mas também provoca grande desgaste emocional para toda a família”, comentou Flávia.

O pediatra e especialista no TEA, Fernando Martins, explica que algumas pessoas com o Transtorno do Espectro Autista possuem alteração neurossensorial, conhecida como hipersensibilidade auditiva, tornando-os mais sensíveis a barulhos e ruídos. “Com a soltura de rojões e fogos de artifícios, principalmente nas festas de final de ano, esses pacientes desencadeiam muitas vezes, agitação, pânico, choro inconsolável em crianças, exacerbação de estereotipias (movimentos repetitivos) e até mesmo autoagressão”, salientou Martins.

Segundo o pediatra, os efeitos dos rojões dos fogos de artifício podem ser duradouros. “Há casos de regressão na interação social, ansiedade e pânico associados aos fogos. Por isso, precisamos de uma melhor conscientização, fiscalização e punição para a soltura de rojões e fogos de artifício com barulho, visando minimizar os impactos à saúde mental causados por essa prática”, enfatizou Martins.

A confeiteira Márcia Mafra, mãe de um autista com sensibilidade auditiva, lamenta que não haja fiscalização da lei que proíbe a solta de fogos de artifícios com barulho. “Meu filho já passou muito mal por causa do desespero. Então, quando foi aprovada a lei que proíbe a soltura de rojões e fogos de artifício com barulho, fiquei muito feliz. Senti-me representada e livre dos transtornos que enfrentamos há anos por causa desses estrondos. Porém, com a ineficácia da fiscalização e das medidas de punição, sinto-me hoje muito frustrada e impotente”, disse Márcia.

Danos para os animais

Além das pessoas com TEA, os animais também são impactados negativamente com os fogos de artifício com barulho. Os rojões podem causar pânico nos pets, levando a fugas, acidentes, convulsões e até óbitos por parada cardiorrespiratória. “Os fogos que emitem som trazem diversos prejuízos ao animal no sentido emocional e físico. Podem ser vistos problemas emocionais de ansiedade e estresse. Para além do emocional, também podem ocorrer lesões físicas”, frisou o médico veterinário, Samuel Silva.

“Tem animais que se machucam ao tentar fugir do barulho. Inclusive, nesse período de fim de ano, aumenta a incidência de atendimentos nesse sentido. Infelizmente, no dia do Natal e Ano Novo a gente que trabalha com emergência acaba sendo acionado para tratar de animais que se cortaram ao tentar fugir”, acrescentou o veterinário. Em relação aos cuidados com os pets nas festas de fim de ano, Silva destaca que precisam ser tomadas medidas antes da solta de fogos.

“Se possível, é importante se programar para este momento e já preparar um ambiente livre de materiais pontiagudos, onde o animal não possa se cortar. Escolher um local com um isolamento acústico melhor, com janelas fechadas. Algo similar a uma toca é bom também para o animal se esconder e se sentir seguro e protegido. O tutor também vai está ali tentando acalmar o animal, transformando aquele momento de estresse em um momento de consumir algum alimento que o pet gosta”, explicou o veterinário.

Silva informa ainda que o barulho dos fogos de artifício pode causar traumas irreversíveis para os animais, como adquirir um comportamento desconfiado, inseguro e medo de todos os sons mais altos. “A longo prazo, o animal pode ficar com a audição prejudicada e sensível a sons. Os animais têm direitos básicos, e dois deles é o de viver livre de sofrimentos e estresse. Então, os fogos de artifício infringem esse direito básico garantido por lei para os animais”, completou o veterinário.

A professora Danyele Freitas contou ao Jornal de Brasília que a sua shih tzu de apenas três anos sempre sofre com os fogos de artifícios. “Ela sempre se agita com barulhos mais estrondosos. Quando começam a soltar os fogos na época de jogos e fim de ano, ela entra em uma condição de pânico. Ela fica muito agitada e com medo. Ela treme demais e o coração dela começa a bater muito acelerado. Eu percebo nela um olhar amedrontado também e ela sempre corre para o nosso colo ou para baixo de algo em busca de segurança”, lembrou.

“Nos dois últimos Réveillons foi bastante complicado para ela. O fato de ainda existir pessoas que soltam esses fogos deixa a gente que é dono de pet sempre sem entender a necessidade de tudo isso. Estamos em um momento de comemoração e os bichinhos fazem parte da nossa família. Com isso, acaba que nós, donos, que estamos curtindo também para de aproveitar para dar atenção para eles”, lamentou Danyele.

O presidente da Comissão de Defesa dos Direitos dos Animais da OAB/DF, Arthur Regis, enfatiza que, embora exista a Lei Distrital nº 6.647/2020, que regula o uso desses artefatos, a norma precisa de ajustes para garantir uma proteção efetiva. “A legislação distrital é mais um importante avanço na proteção dos animais e das pessoas que, por alguma razão ou condição, sofrem com os fogos de artifício com estampidos. Entretanto, de nada adianta uma legislação que não contemple um sistema eficaz de fiscalização e punição para os infratores”, disse.

Dicas para pessoas com TEA

É essencial, sempre que possível, explicar o motivo da soltura dos rojões e fogos de artifício com barulho, mesmo sendo algo proibido por lei, para ajudar o paciente a compreender a situação.

É importante buscar locais com melhor isolamento acústico, como salas ou quartos, até que os ruídos cessem, e utilizar abafadores de som para maior proteção.

O acolhimento deve ser feito por pessoas que o paciente já confie e que tenham experiência em lidar com desregulações sensoriais, motoras e emocionais, garantindo um ambiente seguro e de suporte.

Dicas para ajudar os tutores a protegerem seus animais

Não deixe o animal preso a correntes, pois isso pode causar enforcamento. Muitos bichinhos se enrolam na própria corrente ou tentam pular o muro, resultando em acidentes;

Evite deixar o animal em ambientes com janelas abertas, mesmo que tenham grades. Ele pode tentar pular e acabar caindo ou ficando preso na grade;

Sempre coloque no animal uma coleira com plaquinha de identificação contendo o nome e o contato do tutor. Se apesar dos cuidados houver fuga, a identificação será decisiva para recuperar o bichinho;

Não deixe o animal sozinho e trancado durante os estrondos, pois isso reforça o medo e a associação do barulho a algo negativo. Além disso, há o risco de o pet passar mal sem ninguém por perto para socorrê-lo;

Minimize o pânico criando um ambiente seguro com caixas e tocas;

Nunca brigue com o animal, pois ele não tem culpa de sentir medo. Em vez disso, ofereça carinho e petiscos para que associe o barulho a algo positivo;

Utilize músicas específicas para animais, desenvolvidas para a audição aguçada deles, para amenizar momentos de tensão. É recomendável aumentar o volume do som durante os episódios de estrondos para camuflar, na medida do possível, os ruídos externos. Caso não seja possível, deixe ao menos o som da TV mais alto para desviar a atenção do barulho externo;

Certifique-se de que portas e janelas estejam fechadas, evitando acesso à rua. Muitos animais fogem, se perdem, são atropelados ou ficam expostos a outros perigos;

Em casos de acidente ou mal-estar grave, leve o animal imediatamente ao veterinário.

Por Carolina Freitas do Jornal de Brasília

Foto: Gabriel Jabur/Agência Brasília / Reprodução Jornal de Brasília