O ministro do Supremo Tribunal Federal (STF) Alexandre de Moraes indeferiu um pedido apresentado pela defesa dos coronéis da Polícia Militar do Distrito Federal (PMDF) Paulo José Ferreira de Sousa e Jorge Eduardo Naime, que solicitava a devolução dos celulares apreendidos durante uma operação da Polícia Federal. Os oficiais são investigados pelos atos antidemocráticos ocorridos em 8 de janeiro de 2023.
Moraes justificou que os aparelhos apreendidos ainda são relevantes para o processo que tramita na Corte, podendo ser devolvidos apenas após o trânsito em julgado da sentença final. O ministro também destacou que as alegações da defesa de Naime, relacionadas a eventuais nulidades processuais e outras questões pendentes, serão analisadas no momento processual adequado.
Além dos dois coronéis, outros cinco policiais militares do DF são réus, desde fevereiro, no processo em curso no STF. Eles respondem pelos crimes de tentativa de abolição violenta do Estado Democrático de Direito, golpe de Estado, dano qualificado, deterioração de patrimônio tombado, além de violar a Lei Orgânica e o Regimento Interno da PM.
Réu
Na denúncia assinada pelo coordenador do Grupo Estratégico dos Atos Antidemocráticos da PGR, Carlos Frederico Santos, o procurador revela que existia uma rede de desinformação entre os membros do alto comando, com o repasse de mensagens falsas que colocavam em xeque a lisura do processo eleitoral brasileiro.
Em uma delas, a dois dias do segundo turno das eleições de 2022, o coronel Klepter Rosa enviou uma mensagem, sem nenhum contexto, para o então comandante-geral, coronel Fábio Augusto Vieira. Nela, há um áudio editado atribuído ao ex-candidato à presidência Ciro Gomes (PDT), onde deixa explícito que o pleito eleitoral já estaria “armado”, além de que a ordem será “restabelecida”, afastando o ministro Alexandre de Moraes.
Nas mensagens analisadas pela PF e pela PGR, ao receber esse “informe”, Fábio repassou ao coronel Marcelo Casimiro, ex-comandante do 1° Comando de Policiamento Regional (1° CPR), criando uma rede de desinformação e de mentiras dentro do comando da corporação. No relatório da PGR, as mensagens conspiratórias prosseguiram entre Casimiro e Fábio após as eleições, que elegeram democraticamente o presidente Luiz Inácio Lula da Silva (PT).
Um dos exemplos de que as mensagens circularam entre os integrantes da força foi em 1° de novembro. Nesse dia, nas mensagens obtidas pela PF e anexadas na denúncia da PGR, Casimiro enviou um quadro explicativo que, segundo ele, seria para “regular sucessão presidencial”.
Nela, há três hipóteses: uma suposta aplicação do art. 142 da Constituição Federal; “intervenção militar”; e “intervenção federal” por iniciativa militar. Mesmo duvidando a procedência das mensagens, Casimiro diz: “”Não (sei) se procede esse entendimento, mais (mas) é interessante a explicação”.
Corrente
As mensagens entre os dois não cessaram e, mais para o fim do dia, Casimiro enviou mais uma “corrente de desinformação” onde dizia que existia um relatório das Forças Armadas, dizendo que o ex-presidente Jair Bolsonaro (PL) teria vencido as eleições.
Ao ler a mensagem, Fábio, mesmo sabendo que o conteúdo não era verídico, não retrucou o coronel, que comandava a área responsável pelo batalhão da Esplanada dos Ministérios. “A cobra vai fumar CMT (comandante). Mesmo q (que) não seja verdade”, escreveu.
No trabalho da PGR, de 196 páginas, a denúncia é destrinchada em uma espécie de linha do tempo, com cada acontecimento apurado pelo grupo de procuradores. No recorte feito pela reportagem, a tentativa de invasão à sede da PF, em 12 de dezembro, e o cenário de terror, na capital do país, foram criticados pela PGR. Na denúncia, Carlos Frederico cita que, embora presente no local, a PMDF não prendeu ninguém.
A justificativa dada pelos oficiais, inclusive à Comissão Parlamentar de Inquérito (CPI) dos Atos Antidemocráticos da Câmara Legislativa (CLDF), era de que a corporação optou por colocar “ordem na casa”, principalmente porque parte da equipe estava alocada na diplomação de Lula — o caso ocorreu quando o indígena José Acácio Serere Xavante, conhecido como cacique Tsereré, foi preso pela própria PF.
Apesar das justificativas, a PGR não entendeu dessa maneira. Para sustentar que os coronéis foram omissos, apresentou mensagens enviadas por Casimiro e pelo ex-comandante do Departamento de Operações (DOP), coronel Jorge Eduardo Naime, ao então comandante-geral Fábio Augusto, que indicavam que a corporação teve claras oportunidades de efetuar a prisão dos manifestantes. “Em momento preliminar, concomitantemente aos ataques, Marcelo Casimiro revelou que a Polícia Militar havia produzido informações de que os ônibus com os insurgentes partiram do acampamento em frente ao QG do Exército, em direção à sede da PF.”
Ainda com base na denúncia, Fábio Augusto, Naime e Casimiro tinham conhecimento de que o acampamento no Setor Militar Urbano (SMU) concentrava extremistas e que ali era um ponto de organização para a prática de atos antidemocráticos voltados a garantir a permanência do ex-presidente no poder.
Também são réus no processo o major Flávio Silvestre de Alencar e o tenente Rafael Pereira Martins.
Por Pablo Giovanni do Correio Braziliense
Foto: Alberto Ruy/Secom/TSE / Reprodução Correio Braziliense