A fúria de bolsonaristas nos atos antidemocráticos de 8 de janeiro foi antecedida pela fracassada tentativa de explosão de um caminhão-tanque, abastecido com 63 mil litros de querosene, nos arredores do Aeroporto Internacional de Brasília, na madrugada de 24 de dezembro do ano passado. Há um ano, às vésperas do Natal, três acampados do movimento em frente ao Quartel-General do Exército planejavam atos terroristas, cogitando explodir bombas em pontos estratégicos da capital federal, no intuito de causar um “estado de sítio”.
A empreitada golpista, que se tornaria um dos maiores atentados terroristas do Brasil, não deu certo por muito pouco — tendo em vista que o acionador da bomba colocada no caminhão foi acionado, mas falhou. Em quase quatro horas, a reportagem do Correio acompanhou a equipe do esquadrão de bombas da Polícia Militar do Distrito Federal (PMDF) tentar desativar o artefato. Em uma grande mobilização de três delegacias da Polícia Civil do Distrito Federal (PCDF), poucas horas após o atentado frustrado, foram ao encalço de George Washington de Oliveira Sousa, considerado o mentor do esquema.
O empresário, oriundo de Xinguara, do Pará, alugou dois apartamentos no Sudoeste. Em um dos imóveis, policiais encontraram armas, mais de mil munições, explosivos e materiais como querosene de aviação, além de um detonador por dispositivo remoto da bomba. À polícia, George disse que todo o armamento era regularizado, com exceção das dinamites. O plano inicial, segundo ele, era explodir uma subestação de energia de Taguatinga, após uma mulher desconhecida ter sugerido o local.
A trama contou com a participação de outros dois comparsas: o blogueiro Wellington Macedo de Souza, conhecido como “homem-bomba dos atos golpistas” e do taxista Alan Diego dos Santos, natural de Comodoro, do Mato Grosso. No depoimento, George disse que Alan teria se voluntariado para instalar a bomba, mas que só soube que o comparsa não seguiu o plano original, ao assistir o noticiário no outro dia — uma tese que não foi confirmada nas investigações. Caso houvesse a explosão, segundo uma perícia da PCDF, muito provavelmente a quantidade de explosivo fosse hábil para romper o compartilhamento do tanque, causando um incêndio de grandes proporções.
Com a ideia de explodir o artefato, Wellington e Alan deixaram o acampamento em frente ao QG do Exército e se deslocaram, no carro do blogueiro, por regiões do Distrito Federal. Os dois chegaram a passar pela subestação de energia de Taguatinga, mas logo após voltaram ao centro de Brasília, indo para o aeroporto. A bomba foi deixada por Alan no caminhão-tanque, entre 2h e 5h da manhã. As informações só foram possíveis de serem confirmadas porque o blogueiro era monitorado por uma tornozeleira eletrônica, rompida logo em seguida da tentativa frustrada do artefato.
De acordo com Alan, depois de ter deixado a bomba no caminhão, “a ficha caiu” sobre a gravidade do que havia feito. Ele então procurou um orelhão próximo à Rodoviária do Plano Piloto para ligar para a polícia, mas, segundo ele, o atendente da Central de Emergência da Polícia Militar (disque 190) não acreditou nele. O morador de Comodoro se entregou em 17 de janeiro, após ter sido convencido por familiares a se entregar.
Wellington e Alan já haviam sido identificados pela tentativa de invasão à sede da Polícia Federal, em 12 de dezembro. Os manifestantes incendiaram carros e ônibus, por protesto contra a prisão do indígena e militante bolsonarista José Acácio Serere Xavante, e chegaram a entrar em confronto com a Polícia Militar. O dia também ficou marcado pela diplomação do presidente eleito Luiz Inácio Lula da Silva (PT). Naquele dia, ninguém foi preso.
Ao decorrer das investigações da PCDF, foi constatado que lideranças dos acampados em frente ao quartel do Exército, presos nos atos de 8 de janeiro, cogitaram colocar explosivos na Rodoviária do Plano Piloto entre o fim do ano passado e o início deste ano. A informação foi dada pelo ex-diretor do Departamento de Combate à Corrupção e ao Crime Organizado (Decor), delegado Leonardo de Castro Cardoso, à Comissão Parlamentar de Inquérito (CPI) dos Atos Antidemocráticos, da Câmara Legislativa (CLDF).
Condenados
Os três acusados foram denunciados pelo Ministério Público do Distrito Federal e Territórios (MPDFT) e se tornaram réus em processo que correu na 8ª Vara Criminal de Brasília. George Washington foi condenado, inicialmente, a nove anos e quatro meses de prisão; e Alan Diego, a pena de cinco anos e quatro meses — ambos em regime fechado.
Posteriormente, em outubro, a 3ª Turma Criminal reavaliou a pena dos dois. George Washington teve a pena redimensionada para nove anos e oito meses, além de multa; e Alan Diego cumpre sentença de cinco anos de reclusão, além de multa. Alan chegou a ir para o regime semiaberto, em decisão proferida pela Vara de Execuções Penais (VEP) do Distrito Federal, mas uma decisão do ministro Alexandre de Moraes, do Supremo Tribunal Federal (STF), barrou o despacho.
O processo de Wellington Macedo foi desmembrado pela Justiça. Isso porque, diferentemente dos outros dois envolvidos, ele só foi preso em setembro, na Cidade do Leste, no extremo leste do Paraguai, em operação conjunta da polícia paraguaia e a Interpol. O blogueiro chegou a resistir a prisão, sendo apresentado à delegacia com manchas de sangue e lama pela roupa. Em setembro, o blogueiro foi condenado, em primeira instância, a seis anos de prisão.
Todos os três foram condenados a crimes pelo artigo 251 do Código Penal, que trata de colocar em risco a vida, a integridade física ou o patrimônio por meio de explosão. Eles cumprem prisão no Complexo Penitenciário da Papuda, em Brasília.
Por Pablo Giovanni do Correio Braziliense
Foto: ED ALVES/CB/D.A.Press / Reprodução Correio Braziliense